Nativa - Rui Veloso e Carlos Tê
Sorriste-me junto ao rio
Quando de febre eu morria
entre delírios palustres
e suores me consumia
eu ardia em fogo lento
quando me deste agasalho
passaste em mim um unguento
muito mais fresco do que orvalho
Redimiste-me nativa
das penas do meu degredo
mantiveste a minha alma viva
das penas do meu degredo
mantiveste a minha alma viva
por ti voltei a ser ledo
adorei deus em heresia
dei-lhe outra face sagrada
e à nossa volta no chão
foi crescendo uma erva amestiçada.
Deste-me conchas do mare
um sorriso na boca
e eu nada tinha pra te dar
que se comparasse em troca
dei-te os ferros da razão
dei-te o valor do metal
o castigo e o perdão
e a gramática do mal
dei-te a dor no crucifixo
dei-te a cinza do prazer
se não fosse eu era outro
e antes eu do que um qualquer
dei-te a minha língua mãe
nas tardes desse vagar
o meu bem mais precioso
que eu tinha pra te dar
e esse meu falar antigo
de branco fez-se mulato
um dialecto crioulo
um viço novo no mato.
Samba Enredo 2007 - Mangueira
Composição: Lequinho, Júnior Fionda, Anibal e Amendoim do Samba.
Quem sou eu?
Tenho a mais bela maneira de expressar
Sou Mangueira... uma poesia singular
Fui ao Lácio e nos meus versos canto a última flor
Que espalhou por vários continentes
Um manancial de amor
Caravelas ao mar partiram
Por destino encontraram o Brasil...
Nos trazendo a maior riqueza
A nossa Língua Portuguesa
Se misturou com tupi
tupinambrasileirou
Mais tarde o canto do negro ecoou
Assim a língua se modificou
Eu vou nos versos de Camões
Às folhas secas caídas de Mangueira bis
É chama eterna dom da criação
Que fala ao pulsar do coração
Cantando eu vou
Do Oiapoque ao Chuí ouvir
A minha pátria é minha língua
Idolatrada obra-prima te faço imortal
Salve... poetas e compositores
Salve também os escritores
Que enriqueceram a tua história
Ó meu Brasil...
Dos filhos deste solo és mãe gentil
Hoje a herança portuguesa nos conduz
A Estação da Luz!
Vem no vira da Mangueira vem sambar
Meu idioma tem o dom de transformar bis
Faz do palácio do samba uma Casa Portuguesa
É uma Casa Portuguesa com certeza
O Sobrescrito - João Gil
Bateram ao postigo.
Era o carteiro
Trazia um sobrescrito de Lisboa
Não era engano:
O nome estava inteiro
Era dirigido à minha pessoa
Abri-o logo ali:
Era a respeito
De um pedido que em tempos eu fiz
Para qualquer ofício ganho o jeito
Mesmo que seja só como aprendiz
Tantas voltas dá a vida
Tantas voltas dá o Mundo
E depois volta não volta
Muda tudo num segundo
Nessa tarde já não saí de casa
Sentei-me frente ao lume a matutar
Enquanto dava a volta a uma brasa
Há dias de perder e de ganhar
Meti a tralha toda para um cesto
E mesmo ainda assim sobrava fundo
O que ficou tinha muito mais texto
Não cabe em nenhum verso deste mundo
Tantas voltas dá a vida
Tantas voltas dá o Mundo
E depois volta não volta
Muda tudo num segundo
Foi toda a minha gente a despedida
Ao Largo donde partiu a carreira
Abraços, beijos e até comida
Cada um exprime-se à sua maneira
E foi assim que a vida deu uma volta
A carta e os conselhos de um braseiro
O campo por onde eu andava à solta
Agora está no fundo de um estaleiro
Tantas voltas dá a vida
Tantas voltas dá o Mundo
E depois volta não volta
Muda tudo num segundo
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